2015-06-06

11) Big Data e estratégia

#bigdata #hadoop #spark

A palavra “estratégia” pode ser em muitos casos substituída por “com ênfase nos objetivos de longo prazo”. Por exemplo: “plano estratégico” deve ser entendido como “plano com ênfase nos objetivos de longo prazo”. Nações, povos, indivíduos e empresas fazem bem em cultivar seus próprios planos estratégicos, pois muitos planos (os bons) fazem sentido apenas se praticados em prazos longos. O oposto de ter e cultivar um plano estratégico é seguir os conselhos do Zeca Pagodinho com a música “deixe a vida me levar, vida leva eu ...”. Quem não tem plano estratégico não está indo a lugar nenhum. O mundo não costuma ser benevolente com quem pensa e age assim.

Pensemos na origem da palavra “crise” em chinês. A imagem representa as 2 letras chinesas que combinadas significam “crise”, sendo a letra da esquerda a representação de “perigo” e a da direita “oportunidade”. Pronuncia-se “wéijī”. O Brasil encontra-se claramente em situação de grave crise. Nesse Post abordo os aspectos de perigo e de oportunidade da nossa crise corrente. Apresento também um argumento que Big Data é um bom componente para um plano estratégico coletivo e individual.

O Perigo: O programa Globo News Painel, exibido no dia 30/05/2015, conduzido por Renata Lo Prete, tem título “Especialistas avaliam a polêmica sobre o ajuste fiscal”. A pauta foi de “tentar esboçar uma agenda de desenvolvimento para o Brasil, pós ajuste fiscal”. Consta que quase todo mundo concorda que “a retomada do controle das contas públicas não basta para produzir crescimento”. Para piorar “como se pode falar num pós ajuste, se o próprio ajuste não está assegurado?”. Os convidados para discutir o tema foram Marcos Lisboa, Fernando Sampaio, Cesar Benjamin. Vou fazer uma seleção de citações desse programa. Numa passagem do programa, Cesar Benjamin comentou que “nós (brasileiros) vivemos numa região muito periférica do mundo; a minha impressão é que o mundo quer do Brasil alimentos (soja e outros alimentos), minérios, petróleo, e de preferência temperado com uma cerejinha de juros altos (…); se o Brasil oferecer ao mundo alimentos, minério, petróleo e juros altos, o mundo está (sic) satisfeitíssimo (…); se nós (brasileiros) quisermos não ficar nessa posição (…) nós temos que ter uma enorme capacidade de fazer um esforço endógeno; nós dizermos 'não é essa a posição que eu quero, eu quero construir uma outra' como os Estados Unidos fizeram no século 19, em que eram país periférico como o Brasil e terminaram o século como a grande potência industrial, como a China vem fazendo na segunda metade do século 20 para cá; quer dizer, são grandes países periféricos que num certo momento da sua história disseram: 'eu não quero esse lugar que vocês estão me designando, e eu vou construir o lugar que eu quero, e vou pagar o preço, porque isso tem preço'. Eu acho que o Brasil perdeu essa capacidade. Isso não tem a ver exclusivamente com o governo Dilma. É uma coisa muito mais ampla. Envolve o nosso sistema político e envolve o nosso Estado Nacional, que foi completamente depauperado. Nós há muitos anos construímos governabilidades de curto prazo a custa do loteamento do Estado, gerando uma ingovernabilidade de longo prazo. E o longo prazo chegou. Essa soma de governabilidades de curto prazo gera um Estado que não cumpre suas grandes funções estruturantes.(...) Nós temos um problema que está fora da macroeconomia. Nós não temos hoje um estado nacional e um sistema político capaz de liderar um projeto nacional que diga para o mundo (...): 'Não podemos ser uma economia exportadora de soja, minério de ferro e petróleo. Esses juros que vocês querem, nós não vamos dar.' Para fazer isso você tem que ter custo. Tem que ter um projeto e pagar o custo, como todos os que tiveram projeto nacional pagaram. Nosso sistema político não tem capacidade nem de formular esse projeto nem de bancar nenhum custo associado a ele. Acho que está aí o X do problema.

Antes de prosseguir, faço uma reflexão. É muito citado o fato de o Brasil ser um país com desigualdades sociais. É adequado ressaltar que as desigualdades brasileiras são também educacionais e intelectuais. E existe forte correlação entre deficiência de educação e de nível social. A boa notícia é que todos os humanos possuem quantidade aproximadamente igual do recurso essencial para o desenvolvimento educacional e intelectual: neurônios. Em toda história da humanidade, nunca nasceu um indivíduo com muito mais neurônios que os demais integrantes da nossa espécie. Não se sabe o motivo de eventualmente nascer uma pessoa genial. Aparentemente a capacidade mental elevada é um fenômeno que pode ocorrer em qualquer lugar e tempo. Se estimulado adequadamente, e se houver oportunidade, qualquer um de nós pode fazer alguma coisa sensacional. Na era da Internet, embora a parte estrutural ainda precise melhorar muito, já há acesso a informação e oportunidade para muitas pessoas.

A Oportunidade: Pensemos. O mundo está construindo uma nova sociedade digital. O mobile é o controle remoto do mundo, que está sempre ligado e conectado a Internet (cloud). Há uma quantidade enorme de procedimentos da vida humana que podem e devem ser repensados diante da possibilidade de uso de sistemas digitais, com ênfase em cloud e mobile. O uso intensivo de tecnologia de informação cria enormes quantidades de dados, para os quais a tecnologia de Big Data pode auxiliar para que sejam tratados. As oportunidades que o mundo observa nesse setor são gigantescas. O que nos limita para fazermos no Brasil o melhor software do mundo? O que nos limita para jogarmos o jogo que eventualmente nos tornará autores e proprietários de novas empresas de referência como Facebook? Claro que há alguns fatores que atrapalham especificamente o Brasil. Há quem chame esses fatores de “custo Brasil”. Mas no setor de software, estamos proporcionalmente muito pouco afetados por esses fatores. Não é difícil ter acesso aqui a todo o necessário para desenvolver software e implantá-lo na cloud, da mesma forma que nossos concorrentes.

Estou obviamente pregando que o Brasil tenha pelo menos um plano estratégico: ser um país forte em software. Se quisermos isso para nós, deveremos nos empenhar em criar as condições para favorecer o florescimento dessa atividade. Devemos em primeiro lugar, reforçar a educação básica, e também a educação e treinamento específico para a atividade de software. Tenho procurado conduzir a UFRJ, onde atuo, para que lá se cumpra o papel de formar pessoas que possam de fato atuar em software. Em 2010, criei e sigo ministrando a disciplina de “software para smartphones e cloud computer” na UFRJ. Em 2015 criei e estou ministrando com a primeira turma de “Big Data Developer” da UFRJ. Nos meus cursos, falo muito de tecnologia, mas também falo de estatísticas de mercado e modelo de negócios. Espero formar gente que possa ao mesmo tempo entender de tecnologia e de negócios, pois esse é o perfil mais adequado para favorecer o empreendedorismo.

A melhor notícia que podemos ter é saber que empreendedores digitais brasileiros estão tendo sucesso. Essas histórias servem de inspiração para que mais gente se interesse pela atividade, e com isso se aumente o volume de gente e de conhecimento sobre esse assunto. O eventual vigor da atividade de software deverá também servir de pressão para que outros segmentos da sociedade funcionem melhor. Felizmente há bons exemplos sucesso a reportar. Falo sobre isso em outro Post.

Independentemente de o Brasil efetivamente implementar como política de Estado um plano de longo prazo para ser forte em software, pode-se tomar individualmente a decisão de se preparar para atuar nessa atividade. Software bem feito pode tornar-se meio de vida para muita gente no Brasil. É cada vez mais comum ver gente boa de software trabalhando no Brasil, em favor de projetos de empresas estrangeiras que nos contratam. Eu acho isso excelente. É um sintoma de que software pode de fato uma excelente alternativa de carreira, com muitas oportunidades. Mas é claro que quem atua tem que ser realmente bom, e estudar muito. Big Data está particularmente no foco agora. É um momento excelente para se investir em estudar essa tecnologia, e se preparar para oportunidades que com certeza vão surgir.


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Sergio Barbosa Villas-Boas (sbVB), Ph.D.
software development, Big Data, cloud, mobile, IoT, HPC, optimization
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